terça-feira, 17 de novembro de 2009

(5) Minas anti-pessoal versus minas pessoais

Já vi na sua revista referências indiscriminadas a minas terrestres, minas pessoais e minas anti-pessoal. Na imprensa escrita, aparece também minas antipessoais. Qual vale?

Respondemos com apoio do leitor José João Roseira Coelho, ex-oficial sapador do exército português, que nos remeteu uma exposição sobre o tema.
De acordo com o Manual de Minas e Armadilhas da Direcção da Arma de Engenharia (1965), uma mina é um engenho constituído por um explosivo ou outra substância, contido num recipiente adequado destinado a destruir ou avariar viaturas, barcos ou aviões ou a matar, ferir ou incapacitar pessoal.
Na tipologia das minas, temos:
- Minas anti-carro – destinadas a destruir ou avariar carros de combate.
- Minas anti-viatura – destinadas a destruir ou avariar outros veículos terrestres.
- Minas anti-anfíbios – destinadas a impedir operações de desembarque.
- Minas anti-aerotransportados – destinadas a evitar ou impedir o desembarque de aerotransportados.
- Minas anti-pessoal – destinadas a matar, ferir ou incapacitar pessoal. São as minas de sopro, de fragmentação, de salto e fragmentação ou de fragmentação dirigida, correspondentes às Anti-personnel landmines (ing.), Minas antipersonal ou às minas contra personal (castelhano).
Todas elas podem ainda ser:
- Minas improvisadas – construídas com materiais disponíveis.
- Minas inertes – cópias exactas de minas de série usadas para fins de instrução.
- Minas simuladas – destinadas à montagem de campos de minas simulados.
- Minas de prática – para uso em treinos, produzindo fumos ou ruído quando accionadas.

Como se pode concluir, ao contrário do que se passa com uma arma pessoal (individual weapon), as minas não têm nada de pessoal. Nem são de uso individual nem se destinam a atingir um único indivíduo. Em minha opinião, é um enorme absurdo falar em minas pessoais!
Pegou, há uns anos, a moda de dizer, como plural de mina anti-pessoal, minas anti-pessoais! Apesar de muitas polémicas sobre o assunto, parece-me não haver motivos para duvidar de que o plural deve ser minas anti-pessoal. Do mesmo modo, não passa pela cabeça de ninguém dizer que o plural de repartição de pessoal é repartições de pessoais. (Neste caso, pessoal é um substantivo colectivo e não um adjectivo no singular/plural). A língua portuguesa está cheia de... armadilhas, mas a ignorância, por vezes, faz mais estragos do que muitas minas anti-pessoal!

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

(4) Impacto ou impacte

A questão é velha, a solução é simples, mas a dúvida continua a subsistir. Normalmente pretende-se que prevaleça, por ignorância, o termo “impacto” em vez de “impacte”. Tem havido um esforço, por parte dos indivíduos que mais lidam com a língua, como os revisores, em fazer vingar a forma comum que entendem por mais correcta: “impacte”. Habitualmente surge, já quase sem contestação, a expressão “impacte ambiental”.
O uso de “impacto” como forma mais aportuguesada, com justificação de que em português não existem palavras terminadas em “cte”, não pode ser tomado em consideração, pois há palavras legítimas de terminação única e que são portuguesíssimas (ex.: cinza, índia).
Profissionais que lidam com a língua portuguesa e que devem corrigir o que está errado estabelecem por vezes deduções incorrectas como método de trabalho: “impacte” tomado como embate psicológico e “impacto” usado como embate físico; ou “impacte” como efeito ou consequência e “impacto” como o acto ou colisão.
Em analogia com “controle” e “controlo”, há quem considere “impacto” e “impacte” sinónimos, com base em alguns dicionários contemporâneos. É certo que o povo faz a língua e muitas vezes dando persistência e consistência ao erro. Para que tal suceda, só linguistas estudiosos o poderão legitimar.
Chegando a este ponto, a legitimação, aqui reside a maior justificação. O "Vocabulário Ortográfico" de Rebelo Gonçalves continua ser a “bíblia” que esclarece muitas dúvidas e confusões. O mesmo se poderá dizer do "Grande Dicionário" de Cândido de Figueiredo (o primitivo, em dois volumes, da Bertrand, e não a sua reedição, pretensamente actualizada). Aí sim, valem-nos dois estudiosos de craveira que se dedicaram exaustivamente à língua portuguesa. Para um e para outro, a destrinça é simples:
“impacte” é substantivo; “impacto” é adjectivo. É tudo quanto basta para uma utilização correcta.
Exemplos:
Foi feito o estudo de impacte ambiental.
Prevendo-se a colisão, os cientistas estiveram atentos ao momento do impacte.
É enorme a cratera de impacte.
O projéctil disparado ficou impacto no alvo.
O dardo impacto no solo fora lançado de grande distância.
O problema e a sua solução foram impactos na sua cabeça após erros e repetições constantes.


Como se pode observar, “impacto” é usado também como adjectivo verbal ou particípio passado irregular de “impactar” com os verbos auxiliares “ser”, “estar”, “ficar” e “manter”. Se os verbos auxiliares forem “ter” ou “haver”, o particípio passado obedece à forma regular “impactado”.

Na maioria dos casos, a forma mais usual acaba por ser “impacte” (substantivo) e não “impacto” (adjectivo), pois esta raramente é utilizada. – JLB